O Fator AMADO: Por Que a "Malandragem" Narrativa.
- Ana Amélia

- 7 de set.
- 5 min de leitura
Atualizado: 2 de out.

Voz Narrativa: O Truque de Mestre de Jorge Amado Para Fazer Você Acreditar no Impossível
Olá, caros sobreviventes da página em branco. Ana Amélia na área.
Sabe o que é engraçado sobre manuais de escrita? Eles são ótimos. Salvam a gente de terremotos narrativos, ensinam a amarrar o texto, a não pisar na grama. Mas, depois de um tempo, a gente começa a notar que as maiores obras-primas quebram todas as regras com um sorriso no rosto. Porque, no final das contas, Autor que não é malandro não vende e nem é AMADO, como JORGE.
Hoje, vamos falar de uma técnica de escrita que não está em nenhum livro didático, mas que é o segredo por trás de autores que parecem ter um pacto de cumplicidade com o leitor: a malandragem narrativa de Jorge Amado. Não é sobre trapacear ou enrolar; é sobre ser tão esperto na forma de contar uma história que a sua voz se torna a lei, e o leitor, o seu cúmplice. Se você acha que "mostre, não conte" é o limite, prepare-se para ver como a voz narrativa pode ser, sozinha, um espetáculo.
Para entender essa malandragem, vamos colocar lado a lado dois mestres da literatura brasileira. De um lado, o mundo solar e falante de Jorge Amado. Do outro, a introspecção densa e o peso psicológico de Graciliano Ramos, um mestre da precisão e do rigor que, por contraste, nos mostra a audácia de Amado.
“Que formosura, que beleza de mulher! Um peixão, e se vê que anda contente, que nada lhe falta nem na mesa nem na cama. Até parece mulher de amante novo, pondo chifres no marido... Não diga isso! - protestou Moysés Alves, o perdulário do cacau - Se há mulher direita na Bahia é Dona Flor. Estou de acordo, quem não sabe que ela é mulher honrada? O que eu digo é que esse doutor, com sua cara de palerma, é um finório. Tiro-lhe o chapéu, nunca pensei que ele desse conta do recado. Para um pedaço de mulher assim, tão rebolosa, é preciso muita competência. Com os olhos acesos, completou: Vejam como vai se rebolando. A cara séria, mas as ancas olhem aquilo! - soltas, até parece que alguém está bulindo nelas... Um felizardo esse doutor... Do braço do marido felizardo, sorri mansa Dona Flor: Ah!, essa mania de Vadinho ir pela rua a lhe tocar os peitos e os quadris, esvoaçando em torno dela como se fosse a brisa da manhã. Da manhã lavada de domingo, onde passeia Dona Flor, feliz de sua vida, satisfeita de seus dois amores.”
Aqui, em "Dona Flor e Seus Dois Maridos", a malandragem narrativa de Jorge Amado está em fazer o leitor parte da fofoca. O narrador não está em um pedestal, ele está na esquina, ao lado do leitor, apontando e cochichando. Ele não descreve, ele comenta. A prosa não é uma descrição formal, mas uma conversa de bar, uma orquestra de vozes que constrói a personagem de Dona Flor através do olhar e da malícia da rua. Ele quebra a regra de um narrador onisciente e neutro e nos dá um narrador-cúmplice, que nos desafia com um "acredite quem quiser". A voz é tão envolvente que não importa se a história é verossímil; importa que ela é saborosa.
Agora, vamos ver a precisão em contraste. Um universo completamente diferente, denso, introspectivo, mas igualmente genial. Em "Angústia", Graciliano Ramos nos aprisiona na mente de seu personagem, Luís da Silva.
“Levantei-me há cerca de trinta dias, pensando nos homens, nessas criaturas que se arrastam na terra, sob a opressão de forças que não entendem. Procuro-os e vejo-os em toda parte, debaixo dos telhados sujos, nas vielas estreitas, nos grandes edifícios onde a gente se perde. Vão e vêm, asfixiados pela angústia, e, de longe, parecem formigas, movendo-se em linha reta, na monotonia da existência sem cor. Eu sou assim, também sou uma formiga, mas minha angústia é maior, pois vejo a linha reta. A vida é um círculo vicioso.”
Aqui não há sol, nem calor, nem vozes da rua. A voz narrativa de Graciliano é uma única consciência que se espreme contra o mundo. O estilo é seco, direto, sem floreios. O foco não é na ação ou no diálogo, mas na tormenta interna, na angústia que é, ela mesma, o motor da narrativa. Se a malandragem de Amado é a arte da libertação, o rigor de Graciliano é a maestria da contenção. Ele nos prende, não com uma conversa gostosa, mas com uma claustrofobia psicológica da qual não podemos escapar. É uma escrita que não quebra regras, mas as domina com uma força descomunal para criar seu efeito.
O que a comparação desses dois gigantes nos ensina? Que não existe um único caminho para a escrita. A malandragem narrativa não é uma técnica que se aprende, mas um entendimento profundo da sua própria voz. É a audácia de ser quem você é no papel. É a prova de que você pode ser popular sem ser vulgar, ser acessível sem ser simplório. E se o Paulo André estivesse aqui, ele diria que essa é a perfeita interseção entre a sociologia e a literatura, entre o porquê de um povo e o como de uma narrativa.
Nós, na Letra & Ato, entendemos essa filosofia como a nossa base. Não se trata de impor um padrão, mas de dialogar com a sua obra, de reconhecer a sua voz, a sua malandragem narrativa ou o seu rigor. A revisão não é um processo mecânico, mas uma conversa sobre o que você quer dizer, para que a sua autenticidade brilhe ainda mais.

☕Vamos Conversar?
Se você tem um texto guardado na gaveta, uma história que parece "fora das regras", ou se sente que sua voz autêntica está sendo abafada pela rigidez do mercado, saiba que você tem um parceiro. Um texto é como uma semente, e a nossa revisão é o solo fértil onde ele pode crescer e florescer sem perder sua essência. Não importa a malandragem do seu estilo ou o rigor da sua prosa; o que importa é a sua paixão pela história. E para a paixão, sempre há lugar. Vamos juntos explorar o potencial da sua obra.
A maior malandragem de um autor é saber quando quebrar as regras… e quando pedir ajuda para arrumar a bagunça.
Ana Amélia
Letra & Ato Tradição | Precisão Editorial | Sensibilidade
© 2024-2025 Letra & Ato (antiga Revisão Dialogal). Todos os direitos reservados.



Comentários