Joyce Para Iniciantes: A Revolução Sutil de 'Dublinenses' à Luz de Edgar Allan Poe
- Ana Amélia

- 26 de ago.
- 5 min de leitura
Atualizado: 7 de set.
E aí, pessoal? Ana Amélia de volta, com o bisturi afiado na mão para dissecar mais um monstro sagrado da literatura. Hoje, vamos falar de um cara que bota medo em muito marmanjo por aí: James Joyce.
Mas calma, não vamos nos atirar de cabeça nas 800 páginas de Ulysses (ainda). A gente começa pequeno, pelo início do caos. Porque, veja bem, o gênio que quebrou a língua inglesa em mil pedaços não acordou de um dia para o outro e pensou: "Hmm, acho que vou inventar umas palavras novas hoje". Não, a revolução dele já estava ensaiando seus primeiros passos bem antes, na modesta, mas implacável, coleção de contos chamada Dublinenses.
Muita gente associa o nome de Joyce diretamente à experimentalidade, àquele fluxo de consciência maluco que nos faz sentir como se estivéssemos lendo a mente de alguém, com todos os seus pensamentos desorganizados, sem vírgula, sem freio. E é verdade, ele foi o rei disso. Mas a experimentação em Dublinenses não é aquela quebra-quebra de regras que a gente vê em Finnegans Wake.
É algo mais sutil, mais sorrateiro, mais… bisturi.

A experimentação de Joyce aqui é uma cirurgia de precisão. Ele não está jogando tinta na tela; ele está esculpindo detalhes com uma precisão quase sádica. O próprio autor descreveu o estilo como de "escrupulosa mesquinhez" (scrupulous meanness). Se isso não é um marketing de guerrilha, eu não sei o que é. Ele queria ser minucioso, impiedoso, sem floreios. O objetivo? Descrever a paralisia de Dublin, a estagnação moral e emocional de uma cidade que, para ele, era o epicentro da melancolia.
Vamos para o nosso primeiro exemplo. Em A Arábia, o protagonista, um menino, está obcecado pela tia de um amigo. Ele jura que vai comprar um presente para ela em uma feira, a Arábia, que para ele é a promessa de um mundo exótico e romântico, longe da vida cinzenta de Dublin.
A luz esvaecia-se do céu, e eu estava em um edifício vasto e fúnebre. Ouvi uma voz vinda de uma barraca acima de minha cabeça que ela estava fechando. Vi sua mão, uma mão branca, enquanto emergia de uma dobra de seu vestido e puxava uma corda. Eu estava em um edifício vasto e fúnebre. Ouvi uma voz vinda de uma barraca acima de minha cabeça que ela estava fechando. Vi sua mão, uma mão branca, enquanto emergia de uma dobra de seu vestido e puxava uma corda. Ouvi uma voz vinda de uma barraca acima de minha cabeça que ela estava fechando. Vi sua mão, uma mão branca, enquanto emergia de uma dobra de seu vestido e puxava uma corda. Ouvi uma voz vinda de uma barraca acima de minha cabeça que ela estava fechando. A luz esvaecia-se do céu, e eu estava em um edifício vasto e fúnebre.
Aqui, a epifania do garoto não é uma grande revelação dramática. É um detalhe. Um instante de desilusão. A feira não é a Arábia; é um galpão escuro e vazio. A voz do vendedor anuncia o fim do expediente, e a mão que puxa a cordinha não é a de uma deusa, mas a de uma mulher comum. A linguagem de Joyce concentra toda a desilusão do menino nesses poucos traços, revelando a alma de um objeto (a feira) e a verdade de uma situação sem precisar de um discurso longo e filosófico. É um soco no estômago disfarçado de sussurro.
Agora, para mostrar que essa técnica não é exclusividade de um autor irlandês, mas uma ferramenta da caixa de truques dos grandes mestres, vamos dar um pulo no século XIX, para o universo gótico e sufocante de Edgar Allan Poe. Em A Queda da Casa de Usher, Poe nos apresenta a família Usher, que está se desintegrando, e ele faz isso através da descrição de um único e implacável detalhe: a casa em que eles vivem.
Havia, é certo, uma rachadura imperceptível, que, partindo do telhado da fachada e seguindo em ziguezague pela parede, perdia-se nas águas obscuras do pequeno lago que circundava a casa. Mas esta fissura era tão pequena que a minha mente recusou a pensar na sua importância; ela era, na verdade, a única fenda visível na fachada da casa.

Percebem a magia aqui? A rachadura na parede não é só um defeito estrutural. Ela é um símbolo. É o diagnóstico de uma família condenada, de uma mente em colapso, do destino final de tudo que é Usher. Poe não diz "a família está doente, a linhagem vai acabar, o terror está iminente". Ele apenas nos mostra a fissura.
E, assim como Joyce, ele confia na nossa inteligência como leitores para conectar os pontos. A "paralisia" de Dublin tem sua contraparte na "decadência" da Casa de Usher. Ambos os autores entendem que o terror, a melancolia e a epifania não precisam ser gritados. Eles podem ser sussurrados através da descrição de um detalhe.
Essa forma de usar a linguagem para criar atmosferas densas e revelar a psicologia dos personagens, sem alarde, é a verdadeira sementinha da revolução de Joyce. Ele estava, ali, pavimentando o caminho para o que viria. Ele estava aprendendo a usar o discurso indireto livre para se misturar à voz dos seus personagens, a capturar a oralidade de Dublin e, principalmente, a criar essas epifanias que são o coração de cada conto, momentos de súbita revelação.
Como diz o meu colega Paulo André, a teoria por trás disso é fascinante, sobre como a linguagem pode ser tanto um meio de comunicação quanto um fim em si mesma, uma ferramenta para mapear a consciência humana. Mas eu, como vocês já sabem, fico com o "como". O "como" é que Joyce, em Dublinenses, mostra que um grande escritor não precisa de pirotecnia para ser revolucionário. Ele pode ser um cirurgião meticuloso, dissecando a alma das coisas com a ponta de uma caneta.
Essa é a diferença entre escrever e ser um escritor. É enxergar o que ninguém mais vê, é saber que a verdade pode estar em um detalhe insignificante, e que para mostrá-la, você precisa de uma equipe de revisores que entende o seu texto no nível mais profundo. Uma equipe que não apenas conserta vírgulas, mas compreende as epifanias da sua própria prosa, o que você quis de fato dizer. Porque a gente, na Letra & Ato, não só faz revisão, a gente entra na sua cabeça e no seu texto. A gente vive a sua obra.
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Afinal, a maior revolução linguística de todas é aquela que acontece entre o que o autor escreve e o que o leitor, de fato, compreende.
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